Tenho um amigo que apanha da mulher. Mas apanha mesmo. Ela bate de mão fechada, tira sangue e tudo mais. A coisa não começou de uma hora para outra. Foi lenta e inexoravelmente. Assim: um dia, durante uma discussão, ela deu um beliscão nele. E ele, em vez de ficar chateado ou brabo, tornou-se mais carinhoso.
Foi como um código para ela.
Um recado.
Na briga seguinte, o beliscão foi mais forte. Ele ficou ainda mais meigo. Fez biquinho. Cara de pocolino. Na terceira discussão, ela deu um tapa no ombro dele. Ele abaixou a cabeça e ganiu feito um cachorrinho. Em algumas semanas, ela já estava dando na cara dele.
Ela batia e o insultava aos berros. O prédio todo ouvia os xingamentos:
— Safado! Sem-vergonha!
Alguns vizinhos até colaboravam:
— Corno!
E ela:
— Isso mesmo: corno!
Meu amigo chegou ao fundo do poço da dignidade.
Um dia, quando o encontrei sentado sozinho num bar, meio bêbado, com um olho roxo, não agüentei mais. Falei:
— Cara, tu tens que deixar essa mulher. Pela tua honra, pela tua saúde mental, pela tua hombridade, pela dignidade do gênero masculino, tu tens que deixar dela! Ela bate em ti, meu!
Então ele ergueu aquele olho roxo, me olhou com uma cara pidona de cachorro vira-lata, e gemeu:
— Mas eu gosto tanto...
E até hoje eles vivem felizes, uma sádica e um masoquista juntos, cada um contente com seu papel.