Com nota alta no Enem, ex-interna da Febem entra na faculdade
Os dois anos na Fundação Casa (ex-Febem) não fizeram com que uma menina de 19 anos, desistisse dos planos de cursar uma faculdade. Estudiosa, ela fez o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem buscar) no ano passado, durante o período que ficou na instituição. Tirou 81,27 (numa escala de 0 a 100), e garantiu uma vaga num curso superior pelo Programa Universidade para Todos (ProUni), do Governo Federal, que dá bolsas de estudos em entidades privadas.
A menina foi presa por tráfico de drogas e depois do tempo na fundação, recebeu o benefício de poder ficar em casa contanto que frequente atendimento especializado semanalmente.
A nota da estudante no Enem foi superior à média nacional dos participantes do exame em 2006 que tiraram 42,95. A pontuação da ex-interna também foi maior que a média da escola que apresentou o melhor desempenho do Brasil, o colégio piauiense Dom Barreto, com nota de 74,71.
Calada, a agricultora diz que não gosta de falar e se limita a dizer que desde cedo colocou os filhos na creche e na escola porque não tinha com quem deixá-los. “Meu marido me abandonou quando essa menina tinha 3 anos, criei todos sozinha.” A família (a menina, um irmão e uma irmã, além da mãe) vive numa casa de três quartos que foi construída num terreno doado pela prefeitura num bairro pobre da cidade. A mãe ganha um salário mínimo de aposentadoria.
A falta de estímulo em casa não atrapalhou a se dedicar aos estudos. "Nunca faltava à aula e prestava atenção em tudo o que os professores diziam, não ficava conversando", conta. Ela diz que sua matéria preferida era ciências, porque tinha curiosidade de entender o funcionamento do corpo humano. Ela cursou o segundo e terceiro ano do ensino médio na fundação e diz que o lado bom é que lá tinha mais tempo para estudar.
“Só não dava para fazer exercício porque não pode levar nem caneta nem lápis para o módulo [espécie de casa onde fica um grupo de adolescentes] porque essas coisas podem ser usadas como arma”, explica.
A garota foi presa a primeira vez com 230 gramas de maconha escondidas na casa de sua irmã mais velha, de 26 anos. Ela diz que era a primeira vez que negociava droga, apesar de ser usuária de maconha desde os dez anos. A jovem acredita que foi traída por amigos. “Na vida do crime é assim, um quer ser melhor que o outro e entregam [para a polícia] mesmo.”
A prisão foi mais traumatizante do que ela podia esperar porque acabou envolvendo também sua irmã. Com R$ 600 na bolsa, de um empréstimo bancário, a irmã foi presa, pois os policiais pensaram que o dinheiro era fruto de venda de drogas. Ela passou dois meses na cadeia até ser libertada.
Hoje em dia ela afirma que não tem mais contato com os amigos daquela época. Do tempo da Febem, também não guarda boas recordações das colegas. “É complicado viver com um monte de mulher durante 24 horas. É muita intriga, muita inveja. Tem menina que não gosta quando vê as outras melhorando e arma logo uma confusão.”
Passados os anos de dificuldade, agora sua preocupação é com o futuro. “Vou estudar muito para conseguir um estágio, depois um bom emprego”, conta. “Quero ir morar numa cidade como Ribeirão, casar e ter filhos. Uma vida normal”. Algum conselho para quem acha que não pode melhorar de vida? “Para a gente conseguir alguma coisa é preciso lutar e não pensar nos problemas e sim nas soluções. Ser positivo, dizer ‘vou vencer’ e caminhar para frente.”
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