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Entenda a CHINA

Categorias , , | Postado em 07:20

Entenda a CHINA

No século 11, por exemplo, havia o déspota Zhou, da dinastia Shang. Se alguém se rebelasse contra o seu poder, Zhou não vacilava. O rebelde desaparecia e só era visto de novo quando bem morto, seu corpo mutilado exposto nas ruas da cidade. Outro hábito que tornou Zhou célebre foi o de encher sua piscina particular com vinho. Entendo Zhou. Meu sonho era de, um dia, ver uma piscina cheia com toda a cerveja que já bebi na vida.

Já o imperador Sui Yangdi, do século 7, gostava de mulheres, de beber e vivia na opulência. Devia ser divertido o imperador Sui. Seu chamado “barco dos prazeres” era remado por belas moças presas com fitas de seda. Achei muito estimulante isso de belas moças presas com fitas de seda.

Aliás, a seda pode ter diversos significados na velha e boa China. Em 1858, um nobre chinês estava na Europa, negociando tratados com as potências estrangeiras – Inglaterra, França e Estados Unidos. Sabedor do resultado das negociações, o imperador não ficou feliz e enviou um arco de seda ao embaixador. Ao recebê-lo, o nobre estremeceu: queria dizer que, naquele momento, ele tinha autorização para se suicidar com ajuda dos servos. O embaixador acatou a sugestão imperial.

Acerca de suicídios: o Partido Comunista simplesmente os proibia para os seus militantes, na época de Mao. Se o integrante do partido descumprisse o interdito, seus familiares sobreviventes é que sofriam: carregavam o rótulo de parentes do traidor pelo resto da vida e não conseguiam mais cargos públicos, problema sério numa economia estatizada, como era a chinesa então.

Também tem a história do imperador Hongwu. Um homem perigoso, aquele imperador. Na verdade, chamava-se Zhu Yuanzhang, mas ele mesmo adotou o nome de Hongwu, que significa “extenso poder militar”. Existem retratos pintados de Hongwu, e eles não são agradáveis de se ver. Sua feiúra era cantada em toda a extensão da Grande Muralha. Seus contemporâneos diziam que tinha “olhos de fênix, mandíbulas de dragão e sardas espalhadas por todo o rosto”. Sardas espalhadas por todo o rosto sou capaz de imaginar, mas alguém aí por favor me diga como seriam esses olhos de fênix e as mandíbulas de dragão.

Enfim. Hongwu foi um imperador importante, a despeito de sua aparência. Fundou a Dinastia Ming, que quer dizer “brilhante”. Essa dinastia durou 300 anos, do século 14 ao 17. Foi um período de estabilidade na China, a ponto de o número de habitantes do país duplicar de 80 para 160 milhões, quase a população atual do Brasil.

O problema com Hongwu é que ele era paranóico e agressivo, duas características que, quando reunidas na mesma personalidade, tornam-se explosivas. Uma vez, o imperador descobriu que um ministro conspirava contra ele. Mandou decapitá-lo e, por garantia, também a todos os membros próximos ou distantes da sua família. O total de execuções chegou a 40 mil, o que mostra que esse ministro tinha família grande. Quando desconfiava de alguém, Hongwu valia-se deste eficiente método da decapitação. O número de oficiais e funcionários públicos que ele mandou decepar chegou a 100 mil. E ainda assim a população chinesa aumentava, veja como são prolíferos os chineses.

Para as faltas menos graves, Hongwu bolou um engenhoso sistema de punições por meio de espancamento com varas de bambu. Funcionava assim: o infeliz condenado era agarrado por mãos e pés. Suas nádegas nuas eram fustigadas com a tal vara de bambu, enquanto um auxiliar do carrasco, que ganhava só para fazer isso, contava em voz alta:

– Uma bastonada com vara de bambu!

– Duas bastonadas com vara de bambu!

– Três bastonadas com vara de bambu!

Era chato. A pele das nádegas rachava e infeccionava. Muitas vezes a vítima morria. Muito chato.

Hongwu era centralizador, defeito de inúmeros chefes inseguros. Aboliu vários cargos de ministros e assumiu suas funções. Conta a história chinesa que o imperador examinava 1,6 mil despachos em oito dias, numa média de 200 documentos em 10 horas de trabalho diário. Ou seja: cada documento merecia três minutos da atenção de Hongwu, mais ou menos a carga de trabalho de alguns juízes de direito no Brasil.

Essas histórias todas, quem queria contá-las era Sima Qian, o maior historiador da antiga China, filho de outro grande historiador, Sima Tan. Como seu pai, Qian era astrólogo da corte e tinha acesso irrestrito à grande biblioteca imperial. Por conta de tais facilidades, pôs-se a escrever a história da China. O imperador resolveu conferir como andava o trabalho e descobriu que o historiador queria... contar a verdade!

Mandou castrá-lo, o que é ainda mais chato do que ter as nádegas espancadas com varas de bambu.

Como se pode ver, autoridades chinesas não costumam tolerar oposição ou desobediência. Em 5 mil anos de história, porém, nunca a China respirou tanta liberdade. Os chineses podem estudar, ler livros estrangeiros, ver filmes e seriados de TV, viajar e enriquecer à vontade, que muitos enriquecem. O dinheiro está libertando os chineses. Por que iriam se importar com pormenores como o direito de escolher e criticar seus governantes?


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