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A vinganca do Zagueiro

Categorias | Postado em 07:30

A vinganca do Zagueiro - Parte 2

Você sabe: dois dias antes da grande decisão, o zagueiro Altair entrou no banheiro do vestiário e viu escrito na porta: "Keka uiva". Keka era a mulher dele! E ela, realmente, uivava nos momentos de prazer. Logo, Alguém estava tendo um caso com a sua Keka. Pior: no dia seguinte, ele entrou outra vez no banheiro, a Casinha Dois, como chamava, e deparou com outra frase: "Eu sei". Dois jogadores sabiam que Keka uivava! Dois!!!

Altair saiu do banheiro. Olhou em torno do vestiário. Meia dúzia de suspeitos. Devia ser um deles. Mas... e se o traidor tivesse freqüentado o banheiro no dia anterior? Maldição. Maldição! Podia ser qualquer um. Altair ficou nervoso. Precisava pensar.

Saiu andando a esmo, cabeça baixa, falando sozinho. Lembrou de uma tarde em que havia chegado um pouco atrasado ao treino. Deparou com os jogadores sentados em rodinha, no centro do gramado, rindo. Um deles, o centroavante Luís Fernando, era o que mais ria. Gargalhava. E fazia:

— Ouuuuuuuuououououuuuuu...

Imitando um uivo!

No dia do incidente, Altair não deu maior importância. Deviam estar rindo de uma piada qualquer. Mas agora lembrava da expressão deles quando o viram: calaram, ficaram constrangidos. Desgraçados!

Altair deu a volta no estádio. Entrou em campo. Era um treino recreativo. Debilitado pela noite em claro e pela tensão da cornice potencial, ele mal participou, preocupando ainda mais o professor Ferreira. No final, o técnico o chamou a um canto do vestiário.
— O que há, Altair? Está nervoso por causa do jogo de amanhã?
— Não, não, professor. Eu só dormi mal. Amanhã vou estar na ponta dos cascos.
— Tudo bem mesmo, meu zagueirão?

Altair sorriu. Gostava quando o técnico o chamava de meu zagueirão.
— Tudo bem, professor. Estou pensando só na decisão.

Não era verdade. Altair pensava apenas em sua testa. Via-a ornada com uma galharia de alce, como uma paineira desfolhada, tinha a impressão de que todos ao redor percebiam e o acusavam: corno, corno, corno. E riam dele. E caçoavam de Keka. A sua Keka.

Altair precisava descobrir quem mais sabia da traição e quem mais havia usufruído dos prazeres uivadores de Keka. Traçou um plano.

A Casinha Dois era a chave de tudo



Decidiu que, à noite, enquanto todos estivessem dormindo, desceria ao vestiário e ficaria de campana, num canto em que pudesse observar os banheiros, os únicos da concentração. Vigiaria a Casinha Dois. Se alguém escrevesse algo a respeito de Keka... a vingança! Vingança de zagueiro.

À noite, na penumbra do vestiário, lá estava o zagueiro Altair, agachado num canto umbroso, quieto. Esperando. Esperando. Finalmente, alguém desceu ao banheiro. Entrou. Na Casinha Dois!

Quem seria? Altair não conseguira ver direito. Esperou um pouco mais, ansioso. A segunda noite insone. E no dia seguinte havia a decisão. O maior jogo da vida de todos eles. A coroação de um trabalho perfeito do professor Ferreira e do grupo de jogadores. Azar! Ele precisava descobrir.

Então, a porta se abriu. E, sob a réstia de luz do banheiro, lá estava... o professor Ferreira. Será que ele?...

Altair deixou que o técnico subisse de volta aos quartos. Correu à Casinha Dois. Abriu a porta. Havia algo escrito. Algo que fez Altair desmoronar: "Todos sabem". O professor Ferreira, o seu mentor, o seu mestre, também usufruíra das benesses de Keka. Ele e todo o time!

Naquele instante, sentado no chão do banheiro, Altair chorou. Mas logo se pôs de pé. Ele era um zagueiro. Zagueiros não choravam. Zagueiros se vingavam. E, no dia seguinte, ele teria de jogar uma decisão. E Altair jogaria. Sim, ele jogaria.

Altair subiu as escadas da concentração destruído.

A cada degrau, uma porção a mais de ódio se depositava no fundo da sua alma. E ele ia ficando cada vez mais amargo. Porém, cada vez mais decidido. Vingar-se-ia de todos eles. Todos eles.

No dia seguinte, o dia da grande decisão, os jogadores estavam tensos. O professor Ferreira parecia mais nervoso do que nunca. Na concentração, eles falavam apenas do jogo, do jogo, do jogo. Só Altair estava calmo. Estranhamente calmo.

Assim calmo, ereto, sobranceiro, Altair pisou no gramado. Antes do árbitro apitar pela primeira vez, ele olhou para as arquibancadas lotadas. Lá também estava Keka. A sua Keka.

O jogo começou. Antes do fim do primeiro tempo, Altair marcou três gols contra. Saiu de campo no intervalo, substituído. Passou na arquibancada, pegou Keka pela mão e foi embora pisando firme. E orgulhoso.

Agora, todos eles sabiam: ninguém, jamais, deve provocar um zagueiro central.

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